Entre no link abaixo e leia a obra na íntegra.
Memórias de um Sargento de Milícias
Aventuras e desventuras de um futuro sargento
O “Sargento de Milícias” é um romance histórico. Embora a concepção pertença à fantasia, emparelha-se no decorrer dos acontecimentos uma linha de personagens que são domínio da história.
M. A. Major
Um romance de costume que aborda certo período de nossa história. Escrito em um momento em que se discutia no Brasil o fim da escravidão e em que a Europa vivia um tempo de revoluções. Foi publicado pela primeira vez em folhetins anônimos no suplemento de domingo do “Correio Mercantil”, denominado “A Pacotilha”, entre 1852 e 1853. Estamos falando de “Memórias de um Sargento de Milícias”, romance organizado em dois tomos, o primeiro com 23 e o segundo com 25 capítulos. A obra retrata, de forma satírica e crítica, a vida da sociedade carioca do início do século XIX, momento marcado política, social e culturalmente pela regência de d. João VI.
Ao escolher como centro da narrativa uma família proveniente das camadas socialmente menos favorecidas, Manuel Antônio de Almeida expõe não só as características da vida cotidiana dos personagens que circulam nesse espaço, seus conflitos e dramas, mas também p destaca as relações de parentesco e vizinhança; o funcionamento de instituições sociais como a igreja, a escola, a segurança pública. Com isso, o autor traça um quadro divertido da época que retrata.
As histórias dos Leonardos – pai e filho – são o fio condutor da obra que se inicia com as aventuras e desventuras de Leonardo Pataca. Desprezado pela mulher, esse personagem abandona o filho após um forte pontapé e passa a dividir com ele a narrativa. O novo protagonista, o filho Leonardo, ao ser abandonado pelo pai, inicia uma saga de agressões, perdas e vinganças que lhe garantem o desafeto de muitos, na verdade de quase todos os demais personagens. Apenas o padrinho – um barbeiro de origem desconhecida -, que assumiu a sua guarda, ignora as diabruras do menino e vislumbra para ele um futuro seguro, digno, diferente da vida que ele mesmo leva cotidianamente à frente da barbearia. O padrinho pretendia tornar o afilhado padre.
Leonardo, entretanto, traçava planos diferentes daqueles sonhados pelo padrinho. Resistiu à escola, debochou do trabalho, levou a vida a procurar pequenas oportunidades para provocar desarranjos em tudo o que via e por onde passava. Essa história conturbada é acompanhada pela madrinha, a comadre, senhora ocupada em ajudar os vizinhos e acompanhar religiosamente os eventos cristãos, bastante numerosos naquela época. Além disso, a comadre era parteira. Esses ofícios faziam dela também mensageira de tudo quanto ocorria nas proximidades. Por isso, alinhavava, sempre que necessário, histórias daqui e de acolá.
A vida de Leonardo é uma sucessão de diabruras, até o momento em que ele se apaixona por Luisinha, afilhada de D. Maria, mulher rica, sempre envolvida em demandas judiciais. Desse momento em diante, o rapaz passa a dedicar seus dias e pensamentos ao objeto de sua paixão. No entanto, surge no meio desse romance um pretendente mais promissor que Leonardo, já que ele nem sequer tinha dado qualquer rumo para sua vida. José Manuel, que se encantara pelo dote herdado por Luisinha, passa a representar um perigo para o futuro que o padrinho vislumbrara para o afilhado. E o enamorado se vê, então, em uma armadilha.
O costume com uma vida confusa, sem grandes projetos, e seu caráter pouco firme fazem com que Leonardo se enrede em outra situação complicada. Na tentativa de esquecer a dor de não ser o preferido por sua amada, ele se apaixona por outra mulher, Vidinha, já cobiçada por dois primos. Inicia-se, assim, uma nova empreitada para o personagem que, repetindo a vida amorosa acidentada do pai, vive de novo situações constrangedoras e irônicas. Ao se dar por vencido na disputa pela nova amada, o rapaz se mete em mais uma arapuca que o leva à prisão, exatamente como acontecera com o pai.
Vidigal, o responsável pela polícia, curva-se aos desejos de sua amada e não apenas liberta Leonardo, como o nomeia granadeiro de seu batalhão. Depois de muitas diabruras, o rapaz reencontra seu primeiro amor, Luisinha, agora viúva, e ambos decidem finalmente viver o amor do qual se privaram.
Para se casar, no entanto, Leonardo precisa desligar-se de seu cargo, o que consegue a custa de favores da amante de Vidigal, e ganha a nomeação para Sargento de Milícias.
Enquanto isso, Leonardo Pataca, o pai, vive igualmente aventuras e desventuras amorosas que em geral terminam em agressões ou atitudes desesperadas, como a tentativa de conquistar a mulher amada por meio de feitiços, o que lhe rende passagem pela cadeia.
É interessante observar que diversos personagens da trama são referidos pela profissão que exercem e não têm um nome próprio: o barbeiro, a parteira, a cigana, o mestre-de-cerimônias. Essa estratégia narrativa tipifica grupos sociais que integram as cenas vividas pelos personagens centrais. A cada episódio, o leitor recebe informações a respeito da época em que os fatos aconteceram.
O livro preserva em sua estrutura o caráter de folhetim: cada capítulo encerra-se em si mesmo, mas deixa uma ponta para o episódio seguinte. Os eixos dos capítulos são as aventuras, quase sempre amorosas, de um dos Leonardos. A narrativa é bem-humorada, leve e instigante e, ao mesmo tempo, informativa e densa. Essa obra nos conduz a um passeio pela vida carioca do início do século XIX, mesmo que a linguagem possa apresentar alguma dificuldade, uma vez que o autor utiliza o português coloquial de sua época, o que pode provocar algum estranhamento aos leitores de hoje.
Não se trata de obra sentimentalista. Ao contrário, sua leitura nos faz recordar as peças de Martins Pena pelo tom satírico, pela movimentação dos personagens que entram e saem de cena. O texto nos remete também a Machado de Assis, em suas “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, quando o narrador dirige-se com certa freqüência ao leitor, para instigar-lhe a atenção e fornecer dados para que possa continuar acompanhando o desenvolvimento da história.
Romance ou novela publicado regularmente em jornais e/ou demais periódicos, em fragmentos ou capítulos.
Texto original: Neide Aparecida de Almeida
Revisão: Equipe EducaRede